Geração Z(Gen Z) e os desafios de liderança

Há duas semanas eu vi diversas publicações no Linkedin trazendo reflexões sobre a Gen Z, sobre o "cancelamento" dessa geração no mercado de trabalho com muitas críticas das outras gerações em lidar com eles, mas confesso que observei nessas leituras, principalmente de líderes, muitos viéses, rótulos e opiniões emocionadas sobre o tema.

Eu possuo sócios da geração Z (Gen Z) e não os vejo  tão problemáticos quanto o que li, pelo contrário, gosto demais de trabalhar com eles pela facilidade de entendimento deles e posicionamento estruturado nos dilemas que nos deparamos diariamente.

Isso me mostrou que a maioria das empresas precisam sair da "negação" e organizar estratégias para o trabalho com essa nova geração, já que nos próximos 5 anos serão 30% do mercado de trabalho e consumo, o que é essencial para a sobrevivência de qualquer negócio. Não devemos nos enganar e achar que basta abrir a vaga de emprego, que eles virão aos montes atrás de trabalho e ficarão por muitos anos.

Problemas impensados como Demissão Silenciosa, o baixo interesse em cargos de liderança, não tem relação com preguiça ou descaso como outras gerações avaliam, mas trata-se de um novo comportamento consciente de uma geração bem formada e informada.

Quando falamos de análise geracional , precisamos ter em mente que é um tema sensível, complexo e por isso decidi buscar dados para tentar trazer um pouco de racionalidade nas discussões, e traçar norte para que empresas e liderança entendam um pouco mais sobre o tema.

Coincidentemente a Udemy publicou um estudo rico, feito em 10 países em 2024, sobre a geração Z e parti desse estudo para o processo.

Quem é a geração Z

No mundo eles representam mais de 30% da população e no Brasil, segundo o último censo IBGE de 2022 eles correspondem à 43,5 milhões de habitantes, ou seja, 21,5% da população.

Segundo o PNAD, os jovens de 18 a 24 anos correspondem a 12,7% da força de trabalho no Brasil.

No Brasil, essa geração nasceu e cresceu completamente sobre a democracia, com voto direto, sob uma nova constituição(1988), com novos elementos em prol da igualdade, já que o racismo passou a ser crime nesse ano.

Eles viveram sem a hiperinflação devido ao plano real(1994) e foram fortemente inseridos nos projetos de universalização do ensino, e no processo de digitalização social com a adoção da internet no cotidiano brasileiro.


Os Mais-Mais

A geração Z é estereotipada como a geração "mais mais", já que é a que mais teve tempo e acesso à educação, a que mais teve acesso à cultura, a que mais teve acesso à internet, a mais conectada ao mundo digital, a que mais teve dispositivos tecnológicos inseridos no dia a dia, a geração que cresceu e aprendeu com games, a geração que viu o florescimento dos bilionários digitais e suas plataformas, mas através dessas plataformas também presenciaram grandes crises econômicas, novas guerras, a forte depredação do meio ambiente e a filmagem das injustiças sociais que cruzaram oceanos e chegaram na palma das mãos deles pelos celulares.

Esse grupo é extremamente consciente dos problemas e mecanismos do mundo, correspondem a 78% da Gen Z, e daí surge uma aptidão natural por mudar as coisas, o imediatismo de ações, buscar propósito e alinhamento com seus valores.

Eles estudam continuamente buscando boas certificações que façam sentido para sua carreira e comunidade. Não estudam qualquer coisa, eles buscam sentido e propósito nessas escolhas.

Os Nem-Nem

Nem tudo são flores , já que a desigualdade e pobreza no Brasil criaram um outro perfil dessa geração, que corresponde a 22% do grupo. Segundo o censo IBGE de 2022 foi detectado que 10,9 milhões de jovens entre 15 a 29 anos, não estão nem trabalhando e nem estudando perdendo a janela adequada de formação e ficando fora do mercado de trabalho, esses jovem são conhecidos como "nem-nem".

Eles representam 22,3% da Gen Z, sendo que 61,2% são pobres e em sua maioria mulheres(43,3 % são negras e 20,1% brancas) e aproximadamente 2 milhões delas estão cuidando de parentes e afazeres domésticos, o que as afasta da força de trabalho.

A desigualdade de oportunidades faz com que 800 mil jovens não trabalhem pelo simples fato de não existirem empregos formais remunerados onde vivem, o que força a migração destes para grandes centros.

Com isso podemos jogar por terra uma visão única e generalizada da Gen Z, já que temos dois grupos distintos com dinâmicas e contextos bem diferentes

O novo mercado de trabalho

O mercado de trabalho global passa por mudanças e isso afeta consideravelmente as relações e dinâmicas com a geração Z que possui um forte pensamento crítico.

Essa geração entende que o trabalho é importante para conseguir dinheiro, mas não é a única coisa. Eles não sonham em ficar longos anos nos empregos simplesmente pela vocação deles em empreender e gerar impacto no mundo.

Um dado interessante segundo a ZenBusiness no Texas é que 93% da Gen Z economicamente ativa já tomaram alguma medida para empreender. Eles são a geração economicamente ativas com mais afinco para empreender.

Eles trabalham para viver e não vivem para trabalhar!

Empregos com salários baixos, carga horária rígida e poucos benefícios não atraem o grupo mais-mais , que devido a forte educação conseguem buscar outras opções como prestar serviços online para empresas internacionais obtendo muito mais vantagens para si. Eles são digitais, trabalham bem online e são adeptos de vender sua expertise, virar influenciadores, atuar em sistemas de assinaturas ou trabalhos freelance.

Por outro lado os nem-nem não possuem as habilidades exigidas para esses cargos, e as vezes nem condições financeiras de iniciar num emprego (deslocamento, uniformes, etc) como foi detectado numa pesquisa no Reino Unido(ver no fim do artigo).

No Brasil, temos o agravante da informalidade e também da pejotização fraudulenta(disfarce de CLT com contrato PJ) o que afasta a geração Z que entende mais sobre os seus direitos e não se interessam por cenários que não tragam ganhos reais para eles.

A visão de outras gerações

As outras gerações, como dito anteriormente, possuem uma visão enviesada da Gen Z pela própria vivência e na maioria das vezes contraditórias, como por exemplo considerar eles mentes abertas, mas resistente às mudanças e teimosos. Outro viés marcante é considerar eles péssimos em comunicação e viciados em redes sociais.

Um ponto importante que precisamos destacar é que cada geração sofre influência de sua época, e terá comportamentos e decisões diferentes em relação às outras e por isso montamos uma linha do tempo neste artigo para contextualizar e entender  melhor a visão da geração Z.

A Gen Z mais-mais não vai seguir a cartilha das outras gerações, viver como seus pais e avós, passando sufoco por falta de planejamento das outras gerações. Aqui entram duas características importantes deles: são pragmáticos e planejadores.

Eles não vão casar cedo, ter filhos cedo, sair de casa para desbravar o mundo, se encher de dívidas e pagar aluguel. Eles sabem que os salários não são bons e que precisam ser organizados para não passar sufoco.

Eles respondem a estímulos reais, não a promessas e fantasias. Eles se priorizam e não vêem problema nenhum de ficar na casa dos pais  e só sair com segurança!

A Gen Z no ambiente de trabalho

O grupo nem-nem são mais sujeitos à hierarquia e  estruturas de comando e controle vigente, na maioria das empresas existentes, já os mais-mais não são, precisam entender e ser convencidos de muitas coisas. Aqui surgem diversos pontos de atritos que precisam ser mitigados, mas lembre-se que eles são mente aberta para muita coisa.

O que a pesquisa da Udemy captou foi que no trabalho eles buscam alinhamento com seus valores pessoais, clareza no seu crescimento profissional e aprendizado prático.

O que eles mais valorizam num ambiente de trabalho são:

1. Flexibilidade
2. Equilíbrio entre vida pessoal e profissional
3. Comunicação clara
4. Transparência

Aqui já percebemos uma contradição com as outras gerações. Eles se importam com a comunicação, querem melhorar continuamente isso e o mais interessante é que não priorizam a comunicação digital. Querem falar com outras pessoas, discutir idéias e quaisquer tipos de problema.

Entre os fatores que a geração Z acredita que mais contribuem para uma comunicação eficaz, os três principais são:
1 . Aceitação de feedback e disposição para ajustar o estilo (59%)
2. Reconhecimento e respeito por diferentes preferências de comunicação (56%)
3 . Orientação clara sobre práticas de comunicação nas organizações (51%)

A aparente disposição da geração Z para iniciar o difícil trabalho de ajustar o estilo de comunicação com base no feedback de outros é surpreendente.

O feedback estruturado e a interação com os pares é valorizado.

Sobre a visão da liderança a pesquisa também mostrou que eles buscam líderes que inspiram, mentores e não apenas profissionais gerenciadores de rotina. Por terem confiança que estão preparados para as demandas (80% se julgam aptos) eles enxergam a necessidade de lideres que orientem, desafiem e guiem adequadamente sua jornada.

Os principais pontos valorizados na liderança são:

1. Ênfase no bem estar e apoio para a saúde mental
2. Oportunidade para todos funcionários contribuírem com ideias e feedback
3. Uma visão clara e inspiradora para o futuro da empresa
4. Compromisso real com DEI no ambiente de trabalho

O crescimento profissional é valorizado igualmente para a Gen Z, X e Y.

Para as três gerações, as cinco principais motivações são:
1. Alcançar crescimento pessoal e autoaprimoramento
2. Aumentar o potencial de ganho
3. Interesse pessoal no assunto
4. Prazer em aprender algo novo
5. Manter a competitividade no emprego ou setor

Contudo a geração Z tem nitidamente maior motivação que as outras gerações pelo crescimento pessoal e o autoaprimoramento para inclusive impactar sua comunidade e preferem meios de aprendizado contínuo, situacionais e presenciais contradizendo a nossa visão de que eles preferem YouTube e redes sociais para aprendizado.
O meio preferido de aprendizado são projetos reais e oficinas presenciais e por isso não vêem vantagens em aprendizados norteados por IA.
DIVERTIPS

Vimos que analisar a geração Z não é uma tarefa simples, mas sim complexa e precisamos entender que eles serão 30% da mão de obra e do mercado consumidor dentro de 5 anos no Brasil.

Tenha em mente que eles são bem informados e possuem pensamento crítico desenvolvido, logo, velhos hábitos e apelos de RH não funcionam com eles. Para eles incialmente é uma relação comercial e ponto!

Com base no que foi apresentado aqui traremos 5 dicas para atrair e reter a Gen Z:

1 . Formalize e organize os planos de carreira / plano de trabalho estruturado
Empresas sem os cargos estruturados, sem regras claras de ascensão não são atraentes para eles, para ter alguma atratividade é necessário a organização disso. Eles vão querer saber como virar um especialista, gerente ou diretor na empresa e apresentar o caminho claro e casos reais dessa ascensão faz parte da negociação.

Por outro lado, para os trabalhadores PJ é vital que seja feito conforme o previsto na lei, com entregas e prazos bem definidos, sem horário rígidos ou exclusividade do profissional.

2. Contrate benefícios estratégicos e flexíveis
Esses jovens buscam um trabalho mais justo com equilíbrio entre trabalho e vida pessoal. Nesse contexto benefícios como convênio médico com suporte psicológico, plano de academias e bolsas de estudos são excelentes atrativos. Benefícios flexíveis onde eles conseguem gerir a aplicação também é um atrativo. Bons planejamentos de feriados e descansos também pesam na decisão.

3. Invista na formação de uma lideranças apta a trabalhar com a Gen Z
A nova geração precisa de um novo tipo de líder, que os inspire e norteie como crescer na carreira e gerar impacto no trabalho. Esse líder investe menos em política e investe mais tempo na equipe que outros tipos de liderança, não basta delegar, sumir e cobrar, mas ajudar a construir juntos, criando segurança para todos no futuro que estão trabalhando.

Conforme as pesquisas mostraram, eles querem ser ouvidos, precisam receber feedbacks, desenvolver a comunicação na equipe com seus pares sobre diversos temas(não apenas trabalho) e a liderança precisa combinar isso com resultados de curto prazo e ter claramente a visão para o futuro do negócio.

A maior preocupação desse líder deve ser como deixar claro para todos o futuro do negócio, o futuro da carreira deles e como receber e instruir adequadamente a nova geração. Construa bons processos de integração(onboarding) para esclarecer pontos essenciais ao negócio e à jornada do novo contratado.

4. Promova o equilíbrio com vida pessoal e saúde mental
Esse equilíbrio com a vida pessoal fica mais explicito para eles com a flexibilidade no trabalho. Precisamos entender que Isso não implica em deixar de fazer, mas fazer de uma forma diferente.

Prefira home office sempre que aplicável, outros modelos são ruins, envolvem perda de tempo e deslocamento. Crie modelos para férias fracionadas, tenha variações para o dress code caso sua empresa use.

Por incrível que pareça a pesquisa da Udemy detectou que eles gostam de encontrar presencialmente para interação com pares, então treinamentos, oficinas ou até mesmo algumas confraternizações são recomendadas.

Projetos sociais e de apoio à comunidade são bem vistos por eles e ajudam a equilibrar o trabalho deles ao propósito que buscam.

5. Estruture o EVP(Employee Value Proposition)
EVP ( Employee Value Proposition) é algo como a “proposta de valor ao funcionário”, ou seja, aquilo que a empresa tem a oferecer para atrair um novo talento ao seu quadro de colaboradores.

Mais do que benefícios e remuneração, estamos falando de uma imagem da sua empresa (Employer Branding) a ser construída pela experiência dos seus próprios funcionários (EX), cujos depoimentos transmitirão como é o ambiente de trabalho e o quanto sua empresa se importa com eles.
Esse processo precisa ser pensado de forma que contemple todas as fases e experiência do colaborador na jornada em sua empresa, reduzindo atritos desde a atração, contratação até a saída do mesmo.

Afinal, hoje em dia os fatores que são mais decisivos para a permanência do colaborador não envolvem vantagens materiais, mas acréscimos para a vida da pessoa, como oportunidades de crescimento, qualidade de vida e alinhamento de valores.
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Conclusão

O principal erro é usar generalizações e estereótipos para lidar com uma geração que inicia a carreira muito mais preparada, conectada e educada do que todas as outras anteriores . Precisamos entender que lidamos com dois grupos distintos com demandas distintas, mas com uma coisa em comum, que é mudar sua realidade e dos seus.

O passo mais importante como negócio é olhar para dentro e aprender como comunicar e atrair esses jovens que serão seus colaboradores e compradores, que valorizam coisas que traga melhores experiências, qualidade de vida e impacto para todos.

A Diverti Tecnologia tem nativamente ferramentas como termômetro de diversidade, termômetros de cultura e feedback para criar ambientes aptos para qualquer geração.
Além disso contamos com consultorias parceiras, com expertise para apoiar na organização de cultura de resultados, cargos e na construção do seu EVP.

No dia 18/03 faremos um evento presencial, em Campinas, com a Gen Z para aprofundar nas discussões e no final desse artigo tem mais detalhes sobre.

Saiba mais:
Udemy: A geração Z no ambiente de trabalho
Demissão silenciosa
Geração Z e a educação
Panorama Censo IBGE 2022
Os nem-nem
Geração Z não tem pressa de ir embora
Recusa de emprego no Reino Unido
A geração Z e o empreendedorismo
O pragmatismo e a colaboração na geração Z



Evento: DiverTips - Liderando com a Gen Z

No dia 18/03, presencial, em Campinas, às 19:00, a Diverti Tecnologia juntamente com seus parceiros Levva e Era realizarão um evento para discussão da liderança com a Gen Z.


Emerson Silva

CEO

Empreende, palestra, investe e atua com tecnologia a mais de 30 anos.
Especialista em performance, equipes, diversidade e impacto.
Fundador, CEO da Diverti Tecnologia e autor desse post.